Osmar Fávero tem trabalhos fundamentais sobre a produção didática
para a EJA.
No campo da Educação de Jovens e Adultos, podemos
afirmar que os estudos sobre o tema dos materiais didáticos foram inaugurados por
Celso Beisiegel e Vanilda Paiva, nos anos de 1970. Esses estudos revelaram a
importância que os materiais didáticos tinham como um dos elementos
estratégicos da atuação político-pedagógica, tanto nas realizações do poder
público, quanto nas ações que resultaram dos movimentos de educação popular,
entre os anos 1940 e 1970. Ambos destacaram em suas análises a diversidade de materiais
didáticos produzidos e destinados a EJA, predominantemente os materiais
impressos e audiovisuais elaborados pelas campanhas oficiais e atuações da
sociedade civil organizada - analisando seus conteúdos, em particular, os
aspectos ideológicos, e as concepções pedagógicas subjacentes.
Nos anos 1980, foi Osmar Fávero (1983) quem empreendeu uma retomada dos estudos sobre materiais didáticos destinados a EJA publicando
um artigo intitulado “Referências sobre materiais didáticos para a educação
popular” em que realizou um mapeamento da produção didática para a educação
popular dos anos 1950 a 1982. O texto apresentava um histórico cronológico da
produção dos materiais didáticos com foco nas campanhas e programas de educação
de adultos desenvolvidos, nos anos 60, pelos movimentos de cultura e educação
popular promovido pela União Nacional dos Estudantes (UNE) e pela Igreja
Católica, em particular, pelo Movimento de Educação de Base, o MEB. O texto
também abordava, nesse período, as iniciativas do poder público e da chamada
Cruzada ABC. Para os anos 1970 o autor menciona (mas não chega a analisar) a
produção do MOBRAL, e destacava a intensidade e a variedade com que os materiais
didáticos foram produzidos em formato impresso ou audiovisual por instituições
ligadas ao movimento social popular. Já em meados dos anos 2000, num artigo
intitulado “Materiais Didáticos para a Educação de Jovens e Adultos”, Fávero
(2007) dá continuidade ao trabalho anterior e realiza breve balanço sobre a
produção dos materiais didáticos para educação de jovens e adultos elaborados
nos anos de 1980, e apresenta a produção dos anos 1990, com foco em materiais
produzidos por iniciativas da Central Única dos Trabalhadores (CUT) para os
programas Integrar e Integração; a proposta pedagógica do Movimento dos
Trabalhadores Sem-Terra (MST) e os materiais utilizados nos seus acampamentos e
assentamentos; e os livros Palavras de trabalhador, editados pelo Sistema de
Educação de Jovens e Adultos (SEJA), da Prefeitura Municipal de Porto Alegre.
Os trabalhos de Fávero realizam um importante
balanço da produção didática para a EJA, adotando como recorte a produção dos
movimentos vinculados à tradição da educação popular. Além de uma narrativa
sobre as circunstâncias que envolveram a elaboração dos materiais ligados a
esses movimentos, sua análise detém-se na descrição de alguns aspectos
relativos ao método e ao conteúdo sócio-político das obras. Uma análise mais
detalhada do conteúdo do material didático é exposta por Fávero em sua tese de
doutorado sobre o MEB (2006). Sua análise se desenvolve sobre dois materiais
didáticos elaborados pelo movimento, os livros de leitura destinados ao
processo de alfabetização de adultos e manuais de orientação aos professores e
responsáveis pela produção das aulas radiofônicas que formavam: o conjunto
didático Viver é lutar (1963) e o
conjunto didático Mutirão (1965). Na
análise do conjunto didático Viver é
lutar, Fávero inicia com uma contextualização do momento de produção do
material, no início dos anos 60, descrevendo os antecedentes, as intenções e as
formas de recepção social do material (inclusive sua apreensão pela polícia do então
estado da Guanabara e inquérito pelo DOPS). Em seguida apresenta os fundamentos
educativos, descreve a organização do material e discute brevemente a relação
presente entre texto e fotografias, aliás um elemento chave do material. Na sequência analisa o conteúdo
político-ideológico de cada uma das 30 lições que compunham o material. A análise é finalizada com a discussão sobre as repercussões e o significado político do material
e as articulações entre os interesses das classes trabalhadoras com as
diretrizes e ações do MEB e da Igreja Católica no campo social.
Sua análise dá pouco destaque aos exercícios gramaticais e atividades, e, portanto, aos aspectos intrinsecamente pedagógicos do material, dando maior ênfase aos fundamentos políticos e ideológicos. Na realidade, para Fávero os aspectos pedagógicos confundem-se com os aspectos políticos, pois entende que uma didática para educação de adultos deve promover a alfabetização simultaneamente com a “conscientização” que prepara a pessoa para engajar-se na transformação da sociedade.
Sua análise dá pouco destaque aos exercícios gramaticais e atividades, e, portanto, aos aspectos intrinsecamente pedagógicos do material, dando maior ênfase aos fundamentos políticos e ideológicos. Na realidade, para Fávero os aspectos pedagógicos confundem-se com os aspectos políticos, pois entende que uma didática para educação de adultos deve promover a alfabetização simultaneamente com a “conscientização” que prepara a pessoa para engajar-se na transformação da sociedade.
Obviamente, a obra analítica de Fávero deixa
lacunas sobre a produção didática, na medida, em que prioriza a produção
vinculada aos movimentos de educação popular, sem se ater aos demais atores que produziram materiais para a EJA. Mas isso não é demérito algum,
apenas um recorte, aliás deliberado, e que deriva de uma opção politicamente assumida de dar voz
aos grupos militantes da educação popular.
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